O regresso aos inéditos de Samuel Úria, quatro anos depois da edição de “Canções do Pós-Guerra”, faz-se com uma canção com o enigmático título de “2000 A.D.”
O tema teve produção partilhada com Miguel Ferreira e foi gravada no início do Verão, envolvendo a participação de mais de dezena e meia de músicos e cantores.
Estimulado pela realidade do mundo atual e pela frustração sentida com os sinais de regressão civilizacional, Samuel Úria construiu em torno do imaginário do “ano 2000” e das esperanças românticas que a chegada do novo século geraram à época, uma abordagem poética e musical.
E aprofunda esse conceito ao referir que “para uma determinada geração nascida no século passado (…) o cruzar do ano 2000 afigurou-se um marco menos intenso do que a prévia antecipação do ano 2000. A previsão dessa efeméride foi, durante muito tempo, pejada dum sentimento esperançoso, de ensejos otimistas”.
Mas, “mais de duas décadas volvidas, e com os anos a avolumarem-se de forma trivial, a surpresa anestesiou-se e a deceção latente vem engordando.”
E conclui Samuel Úria, ao apresentar este “2000 A.D.”, que “no último meio século, os brados de liberdade passaram de gritos de celebração para gritos de socorro.”
No fim, antes de ouvirmos esta fantástica canção, fica a pergunta no ar: “Não será esta a melhor altura para se cantar um futuro que, mesmo ultrapassado, tarda em chegar?”
João Pedro Bandeira